domingo, 13 de agosto de 2017

O funcionamento limite

Roger Van Weyden

“ …(as pessoas com Transtorno de Personalidade Borderline) são pessoas que são capazes de organizar os pensamentos, mas são incapazes de os articular entre si.” 
Carlos Amaral Dias

Talvez não seja do senso comum saber-se que há investigadores que consideram que o Transtorno de Personalidade Borderline não é uma estrutura (como a neurose ou a psicose….), mas sim um estado da estrutura, designemos por funcionamento limite, que poderemos encontrar em qualquer estrutura (de personalidade),  e manifestar-se num episódio em certas fases difíceis da vida em que as reservas se esgotam e o individuo descompensa.
Acho muito útil este conceito de funcionamento limite. No domínio cognitivo, o apontamento brilhante de Carlos Amaral Dias acerca do transtorno ou do modo de funcionar limite - a capacidade de criar pensamentos mas não os articular entre si. Para que tal fosse possível, seria preciso dialogar com os seus carrascos, pensar nos seus pensamentos, nas suas emoções, no acontecimento ausente, tolerar a frustração de uma mente povoada de dúvidas, incertezas e conseguir digerir a inveja. Confiar no outro e imaginar o seu mundo.  
As pessoas com Transtorno de Personalidade Borderline (ou com o funcionamento limite propriamente dito), são conscientes das contradições que fazem parte da vida, a inteligência permite, mas evitam o conflito interior que elas geram. Ou seja, não sabem lidar com os conflitos que todos nós enfrentamos e com a complexidade das situações. Como resultado, podem deixar-se apoderar pela destrutividade.  
Esta unidade indivisível - não saber lidar com os conflitos e com a complexidade da vida -  leva a impasses existências, incapacidade de pensar, sensação de cabeça vazia, recusa de escolher, falsidade nas atitudes, ambivalência, rigidez afetiva e mental, ao agir (evacuar a frustração em vez de elaborá-la) para não deprimir e à deslocação para o social dos problemas pessoais que provocam conflitos interrelacionais.


quarta-feira, 2 de agosto de 2017

A função: as intenções que levam as pessoas a estarem juntas

Peter Blake, The Fine Art Bit, 1959 (detalhe)

“Em outras palavras todo o nosso interesse pelo mundo externo e pelas outras pessoas baseia-se essencialmente na necessidade que sentimos deles; e precisamos deles para duas finalidades. Uma delas é a finalidade óbvia de auferir satisfação tanto para as nossas necessidades de autoperservação como para as de prazer. A outra finalidade para a qual necessitamos, é para odiá-los, de forma a podermos expelir e descarregar a nossa própria maldade, com todos os seus perigos para fora de nós, e sobre eles.”
Melaine Klein e Joan Riviere Amor, Ódio e Reparação Imago Editora

Fica-se a pensar que a vida não é este preto no branco.  Por nosso orgulho pessoal consideramo-nos complexos, e somos, nas diversas formas como amamos e odiamos. 
Mas vendo bem, quando a vida é amável, não é próprio nos questionarmos sobre o papel que temos na vida de alguém. Não se ajusta. É escusado.
Embora com interrupções no fluir habitual dos dias, no fundo do coração há um sentido para continuar, que nos transcende, porque nos incita a dar o nosso melhor, ao outro, à família.
Pensamos no papel que temos na vida de alguém - as intenções que leva o outro a estar connosco (e vice-versa) - quando começamos a duvidar desse sentido e a suspeitar que não é partilhado. O que somos não é visto. O que o outro vê em nós, não pode ser aceite. Nestes casos, muitas das vezes, o outro só pretende de nós, que lhe prestemos um serviço