domingo, 31 de julho de 2011

A minha teoria


Mas isso são teorias, a própria subsistência é uma teoria. Por exemplo alguém que não lê o boletim meteorológico mas que sabe o tempo porque as nuvens baixaram, a andorinha voou ou qualquer coisa, está a produzir uma teoria. A palavra teoria vem do grego que significa olhar e ver. Se você só olha não percebe, tem de ver. Estamos a produzir teorias, mais ou menos sofisticadas, mas estamos sempre a produzi-las.”
Carlos Amaral Dias Costurando as Linhas da Psicopatologias Borderland Climepsi

Que bom saber isso. Já não sinto culpa pelas minhas teorias. Tenho várias, mas de momento só me arrisco a falar de uma: a minha enorme simpatia pelos pais que permitem que a sua criança pequena transporte para todo o lado o seu objecto (uma fralda, um coberto, um boneco de pano…).
A minha hipótese é que esses pais ainda guardam dentro de si a criança que foram, e sendo capazes de  identificar-se com o seu filho – colocar-se na sua pele –, admitem que ele necessita de apoiar-se em algo que lhe dê conforto e segurança, para além deles próprios.
Comovem-me os estratagemas usados para lavar esses objectos, sem que a breve separação se torne dramática. Sobressalto! O cheiro irremediavelmente parece ter desaparecido, para voltar mais tarde com o uso.
Suspeito que os pais das crianças que não permitem que aquele aconchego se torne possível, associam-no a estados de fraqueza e dependência, que seriam insuportáveis, para eles, tolerar.




domingo, 24 de julho de 2011

A agressão humana mais perigosa


Acerca da certeza que se tem uma verdade absoluta e da utilização do meio circundante para regular as suas próprias tensões, a partir de um ódio ancestral, não transformado, que nega o lugar e a existência dos outros (um louco pode ser cerebral e ponderado, contrariamente ao que às vezes se pensa ). Uma agressividade, sem filtros, que não merece uma segunda oportunidade:

A agressão humana é mais perigosa quando está ligada às duas grandes constelações psicológicas absolutistas: o self grandioso e o objecto omnipotente arcaico. E a destrutividade humana mais pavorosa não é encontrada em forma de comportamento primitivo, regressivo e selvagem, mas sim em forma de actividades metódicas e organizadas nas quais a destrutividade daqueles que as executam está amalgamada com a absoluta convicção acerca da sua própria grandeza e com a devoção que têm às figuras omnipotentes arcaicas”.
Heinz Kohut Self e Narcisismo Zahar Editores

Psicanalista austríaco que nasceu em 1913 e faleceu em 1981(viveu as Grandes Guerras Mundiais).


Leituras complementares: 

http://amp.slate.com/technology/2018/04/anger-isnt-a-mental-illness-but-we-should-still-treat-it.html

- O texto de Isaura Neto e Francisco Vieira O Mal, a Maldade, Violência e Terrorismo,(aqui) ou  aqui.






sexta-feira, 22 de julho de 2011

Mudamos por amor?

Robert Indiana Love (Blue/Green), 1980, Sculpture


É falso que não haja amor como o primeiro, quando se sabe amar, o ultimo, o actual é sempre o melhor”.
António Coimbra de Matos A Depressão Climepsi Editores

Quando se sabe amar? Quando somos capazes de controlarmos os nossos demónios de modo que a segurança e o bem-estar do outro seja mais importante que a nossa necessidade de nos fazermos valer.

Mudamos por amor? Não só deveríamos crescer nas relações, porque a saúde mental é transformação -  “Algumas coisas eu renuncio porque te amo”, Carlos Amaral Dias na conferência “Psicanálise e Educação” Universidade da Madeira, 28 Maio de 2011 - sendo de esperar aprendermos com a experiência. O último amor, o actual, deveria ser sempre o melhor.

António Coimbra de Matos e Carlos Amaral Dias são psicanalistas.

sábado, 16 de julho de 2011

Admirar e elogiar

“A desvalorização dos outros e o esvaziamento das representações objectais do mundo interno são a causa principal da falta de uma auto-estima normal nos indivíduos narcísicos, para além de determinarem a sua notável incapacidade para empatizar com os outros."

Otto Kernberg Agressividade, Narcisismo e Auto-destrutividade na Relação Psicoterapêutica Climepsi Editores

Devo dizer que fiquei perplexa quando me deparei com este texto. Precisei de tempo para compreender melhor: a desvalorização dos outros é uma das causas principais da falta de uma auto-estima normal nos indivíduos narcísicos (até nos que exibem grandiosidade), mesmo sendo dependentes da admiração dos outros. O que chega a ser um paradoxo. 
Chegada aqui, ainda julguei que precisava de mais tempo para tecer algumas considerações sobre este assunto, já que confio na sua veracidade. Conclui, que o tempo todo do mundo poderia não ser suficiente para alcançar a compreensão plena da importância de reconhecer e elogiar o outro. Prossigo.
A desvalorização dos outros, assim como o desdém, são defesas contra a inveja inconsciente. Na sua origem, estão as experiências más ou pouco gratificantes que superaram as boas, vividas nas relações precoces. Consequentemente, por não se ter maturidade para lidar com essas emoções contraditórias de amor e ódio pelas pessoas de quem se dependeu, porque se foi troçado ou humilhado, ou não “levado a sério”, surge a culpa, também ela prematura. As pessoas próximas e as suas qualidades, e a admiração que se poderia ter por elas, não passaram a fazer parte do mundo interior dos indivíduos narcísicos, caracterizando a natureza das relações no presente. Se assim acontecesse teriam dado conforto e segurança. 
Admirar e elogiar (com verdade e de modo desinteressado), são seguramente fontes de auto-estima!

quarta-feira, 13 de julho de 2011

O sádico e o seu parceiro

Fred Marcarini, Mo – A Portrait Photograph

Mas ele (Deleuxe) mostra de forma evidente que o perverso jamais escolherá como parceiro em seu roteiro realizado – sexual – o perverso pretensamente simétrico. O sádico não irá procurar um masoquista excessivamente complacente e que encontre prazer demais no sofrimento: isso é evidente.”
J. Laplanche A Angústia Martins Fontes

Achei muito curiosa esta sentença: o sádico não irá procurar um masoquista excessivamente complacente e que encontre prazer demais no sofrimento. Complexo, para ser assim tão evidente.
Vem contrariar algumas das nossas crenças: todo o carrasco tem a sua vítima. Mas se nos fizer sentido, talvez seja boa ideia revermos as nossas referências.
É possível que seja a recusa de se dar como vítima e o insurgir-se, que faz alimentar o ciclo de vingança, hostilidade e risco, comum a todas as perversões.

Um sádico é sempre um masoquista




Para Freud, um sádico é sempre ao mesmo tempo um masoquista:
“O que caracteriza antes de tudo essa perversão (o sadismo e o masoquismo) é que a sua forma activa e a sua forma passiva encontram-se no mesmo indivíduo. Aquele que, nas relações sexuais, sente prazer em infligir uma dor, também é capaz de gozar com a dor que pode sentir. Um sádico é sempre, ao mesmo tempo, um masoquista, o que não impede que o lado activo ou o lado passivo da perversão possa predominar e caracterizar o aspecto sexual que prevalece”.
Freud Três Ensaios Sobre a Teoria da Sexualidade
Um sádico é sempre, ao mesmo tempo um masoquista, com base no principio que o outro faz parte mim -  devido à capacidade empática. Ou seja, ao fazê-lo sofrer, também eu sofro.
 Porém, Freud não afirmou que um masoquista seja sempre, ao mesmo tempo, um sádico. Freud estava mais interessado em compreender as estruturas (de personalidade) que estavam na base.

domingo, 10 de julho de 2011

Martin Seligman



O psicólogo Martin Seligman, é fundador da Psicologia Positiva e tem uma vasta obra publicada neste domínio. É Director do Centro de Psicologia da Universidade de Pensilvânia.

Para conhecê-lo melhor, aceda aqui.



sexta-feira, 8 de julho de 2011

Eu poderia me apaixonar se você tivesse...



Ele: “Eu poderia me apaixonar se você tivesse talento.”
Cena do filme: Tournée (Tournê)

Na cena seguinte, ela esbofeteia-o. Quer ser amada. Importou-se, mas há quem não se importe de estar numa relação interesseira, com proveitos mútuos, sendo que neste enredo, ele pretende brilhar à custa dela.
No caso de esta relação ter continuidade e centrando-nos na personagem masculina (suponhamos que terá personalidade narcísica), se recorrermos a uma imagem dos bastidores do palco, a relação cria um circuito eléctrico incompleto sem contacto – como ele não reconhece a pessoa total dela, não arranja lugar dentro de si para as coisas boas que ela lhe diz e que faz, e ela não sabe como alcançá-lo.
Sente-se que a relação não cresce, que não se forma nada de novo e enriquecedor (luminoso, também), a partir das interacções do dia -a -dia.
A desvalorização e a sua falta de empatia por ela, tornam este palco ainda mais sombrio.

terça-feira, 5 de julho de 2011

Necessidades e bem-estar subjectivo à volta do mundo

Pirâmide das Necessidades de Maslow

Maslow organizou uma pirâmide das necessidades humanas. Esta hierarquia das necessidades (de acordo com a imagem),  tem como princípio: enquanto as necessidades inferiores não estiverem satisfeitas na vida (as necessidades básicas de água, comida, sexo…), não tem importância para essa pessoa as necessidades superiores (as ligadas à realização pessoal).
Desconfiei sempre desta pirâmide. O meu argumento principal é que o amor é uma necessidade básica. Mas Maslow não pensava assim.
A recente investigação da equipa de Ed Diener, ligado à Ciência da Felicidade, teve por objectivo pesquisar os ingredientes da felicidade à volta do mundo, tendo por base esta proposta de Maslow.
Os pesquisadores descobriram que a diversidade das necessidades não é universal, e a hierarquia pouco importa. Ou seja, uma pessoa pode relatar ter boas relações sociais e isso contribuir para a sua satisfação na vida, mesmo não tendo as necessidades básicas satisfeitas.

A investigação de Louis Tay, Ed Diener. Needs and subjective well-being around the world, encontra-se publicada no Journal of Personality and Social.

Para saber mais, a página da Science Daily , e a da Universidade de Illinois, aqui.

Um resumo da Teoria das necessidades, aqui.

Imagem retirada daqui.

domingo, 3 de julho de 2011

As uvas estão verdes

“Alegar que as uvas estão verdes e voltar as costas com desprezo àquilo que realmente admiramos e desejamos não contribui para trazer maior dose de boa vontade ao mundo em geral.”
Melainie Klein e Joan Reviere Amor Ódio e Reparação Imago editores

A expressão “as uvas estão verdes” é inspirada na fábula da Raposa e as Uvas, e sirvo-me dela para ilustrar certos comportamentos presentes no nosso quotidiano que resultam do facto de se sentir culpa, perda ou desejo em relação a alguém amado, ou pelo menos que representa algo de bom, mas com os quais não se consegue lidar.
Na verdade “as uvas são verdes”, é suavizar a situação. Não só se nega a importância (das uvas) dessa relação, a nossa dependência dela, como para além do desdém e da depreciação do outro (as uvas estão verdes), tentamos provar que este não merece a nossa preocupação e interesse, de tal modo que poderemos desencadear outros comportamentos lesivos para essa pessoa.
Ao proteger-se deste modo de sentimentos depressivos (a percepção da própria hostilidade e a culpa dela decorrente), adquire-se então a fantasia que “agora, sou novamente poderoso”.
Este cenário, costuma perturbar a vítima, que ao sofrer dano, dificilmente aceita que possa ser alvo de novos ataques. Não lhe parece justo. Mas, com estes mecanismos, as pessoas ao se envolverem em totais trapalhadas, estão de facto a lidar com o sofrimento.

Palavra-chave: Defesas maníacas (com os três sentimentos: arrogância, desprezo e triunfo sobre o outro)