quinta-feira, 30 de agosto de 2012

O encanto

René Magritte Le Miroir Magique

“Achavam-me encanto, imagine! Sabe o que é isto de encanto: uma maneira de ouvir responder sim, sem ter feito nenhuma pergunta clara.” 
Albert Camus, A Queda
Fascinada pelo outro, pretendo que as minhas palavras o influenciem magicamente, que o enfeiticem. Avanço nesta busca. Mas o pensamento não parece obedecer por estar desencontrado das palavras que se deveriam sexualizar, e cancelar as indecisões sobre a perfeição do encontro. O embaraço atinge-me. Só me ocorre dizer sim.
Mais tarde, recupero as palavras, o corpo. Tento explicar uma inquietação: não sei se falei demais, ou de menos e se o seu desejo desapareceu entre o meu modo desajeitado.
(O estado de encantamento não permite a lucidez e a frieza da afirmação da personagem de “A Queda”, pelo que, é uma expressão de cinismo.)
 

Entrevista - "Quanto menos se sofrer melhor" #2



Entrevista de Paula Torres de Carvalho a António Coimbra de Matos, publicada no Jornal Publico a 30 de maio de 2000, com o título Quanto menos se sofrer melhor - 2º Parte (a 1ª Parte já se encontra publicada neste blog):

´´E um dos mais distintos psicanalistas portugueses. Hoje, na Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade de Lisboa, vai dar a sua última aula, subordinada ao tema Identidade, Desenvolvimento e Transformações.

...
Público Da cultura?
ACM – Sim, mas as coisas estão conjugadas…

Publico – Pode aprofundar melhor essa ideia de que a procura da psicanálise é a busca da cultura?
ACM – Algumas pessoas procuram a a psicanálise porque têm sofrimento, mas também porque desejam compreender melhor como funcionam, como funcionam os outros e como funcionam na sua relação intima.

Público – E o fato de as pessoas perceberem como funcionam ajuda a ultrapassar os seus problemas? A partir do momento em que se entende o que faz sofrer, deixa-se de sofrer? (Se se tem medo de andar de elevador e se compreende a causa, deixa-se de ter medo?)
ACM – ajuda…

Público – A psicanálise é eficaz como terapia?
ACM – É muitíssimo mais eficaz porque transforma a relação entre as pessoas. Se, por exemplo, tem medo de andar de elevador, poderá ter relações com o mundo que a levam a sentir-se enclausurada facilmente porque teve uma relação asfixiante com asua mãe, por exemplo, ou com os homens, ou com a própria natureza e é da compreensão e da transformação disso que se trata…

Público – A atitude dos homens que procuram apoio é diferente?
ACM – Não.

Publico – Mas os problemas não são colocados de forma diferente?
ACM – Não é fácil…mas, por exemplo, os homens colocam mais problemas de relação de poder, as mulheres mais de sensibilidade emocional. É frequente aparecer-me um homem que se queixa que se sente passivo, que os outros o ultrapassam e que ele não sabe lutar pela vida e uma mulher que não tem relações suficientemente harmoniosas com o marido ou com os filhos ou com o trabalho…

Público – Por que é que tem de haver sofrimento durante a psicanálise?
ACM – Acho que não tem de haver sofrimento. Estou completamente em desacordo com isso. Tem é de se tomar consciência desse sofrimento. Sou dos que pensa que, em psicanálise, quanto menos se sofrer, melhor. Alguns psicanalistas dizem que uma cura não se resolve se a pessoa não se deprimir. Eu digo: se não aparecer a depressão que está escondida. Mas a pessoa pode não ter depressão nenhuma e então não precisa de se deprimir.

Público – E a psicanálise com crianças é da mesma forma eficaz?
ACM – Sim, mas colca mais problemas.

Público – É mais difícil e ou mais fácil?
ACM – É mais difícil e aparentemente mais fácil. Deveriam ser as pessoas mais preparadas a fazê-la e habitualmente acontece ao contrário.

Publico - Mais difícil, porquê?
Publico: O psicanalista tem mais facilidade em perceber a mente do adulto. Com a criança, tem de recordar a sua própria infância ser capaz de se colocar na posição da criança…Mas o principal problema no que respeita à infância é que há alguns problemas que não podem ser totalmente abordados. Um deles, é a relação com a morte que é demasiadamente complexo. Depois, é o problema da relação com os pais, principalmente quando há relações conflituosas, porque começam a surgir alguns pensamentos agressivos e isso não pode ser explorado suficientemente porque poderia levar a uma desidealização dos pais e as crianças não podem passar sem uma certa idealização dos pais. De maneira que a análise da criança, por regra, nunca vai tão longe como a análise do adulto. Muitas vezes, a análise é suficiente para que a criança retome o seu desenvolvimento normal mas, em adulto, terá de fazer mais algum tempo de análise para tratar problemas que não foram suficientemente abordados, designadamente o relacionamento com os pais, a morte, a sexualidade…

Público – E a maioria dos psicanalistas não está para fazer esse trabalho com crianças?
ACM – as pessoas têm de fazer uma preparação específica. As sociedades dão preparação para psicanálise de adultos e preparação discreta para psicanálise de crianças. Quem quiser fazer uma psicanálise de crianças tem de fazer uma psicanálise suplementar.

Publico – Disse que muitas vezes os psicanalistas que seguem crianças não são os mais preparados para o fazer?
ACM – Acontece. Na cirurgia, por exemplo, passa-se a mesma coisa. Os casos mais complicados vão para os cirurgiões menos hábeis. De certo modo os cirurgiões mais hábeis, mesmo inconscientemente, escolhem os casos de maior sucesso.

Publico – E os psicanalistas, com as crianças, também têm tendência para escolher os casos mais fáceis de resolver e abandonar os que são mais difíceis por medo do insucesso?
ACM – Não é conscientemente, mas, inconscientemente, todos fazemos isso.

Publico – Buscar o que é mais fácil e não os ponha mais em causa?
ACM – O mais fácil, o que dê menos trabalho e um maior sucesso.

Publico – Também faz isso?
ACM – Inconscientemente, de certeza que faço uma vez ou outra.

Publico – A psicanálise é eficaz no caso de doenças mais graves como as psicoses?
ACM – Nalguns casos há indicação, noutros não, assim como as neuroses. São análises mais complicadas mais difíceis, em que se tem menos sucesso e que requerem uma maior especialização. Mas pode dizer-se que a psicanálise trata psicoses…No caso de uma esquizofrenia por exemplo, uma psicanálise pode beneficiar, mas não chega. É preciso fazer terapêutica medicamentosa e um trabalho de reintegração social.

A psicanálise é ou não é uma ciência? Os psicanalistas vêm a sua profissão como uma espécie de sacerdócio? Quais as relações entre psicanálise e cérebro? Coimbra de Matos acredita na transdisciplinaridade e na abertura da psicanálise em relação às outras ciências.

CONTINUA











segunda-feira, 27 de agosto de 2012

Entrevista - "Quanto menos se sofrer melhor" #1



Entrevista de Paula Torres de Carvalho a António Coimbra de Matos, publicada no Jornal Publico a 30 de maio de 2000, com o título Quanto menos se sofrer melhor.

De momento, da extensa entrevista publica-se uma 1ª Parte:
´´E um dos mais distintos psicanalistas portugueses. Hoje, na Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade de Lisboa, vai dar a sua última aula, subordinada ao tema Identidade, Desenvolvimento e Transformações.
Mas ainda não será desta que António Coimbra de Matos se vai reformar. Por sua vontade continuará a trabalhar como medico psiquiatra e psicanalista, a atividade que mais se tem distinguido ao longo da sua vida.
Professor há 17 anos, antónimo Coimbra de Matos retira-se, agora aos 70, permanecendo como referencia para muitos dos que foram seus alunos. Natural de uma aldeia do Douro, fez formação académica no Porto, onde tirou a especialidade de psiquiatria, iniciando, de seguida, a sua formação analítica. É pai de dois rapazes e de uma rapariga e tem dois netos de sete e quatro anos com quem faz questão de passear e brincar.

Público – Qual é a sua disposição em véspera da última aula?
ACM – não sinto nada de muito especial …é uma transição da minha vida pessoal, profissional. Mas vou continuar a trabalhar, a fazer clínica, a trabalhar em colóquios culturais e científicos…embora sem aquela obrigatoriedade…

Público – Isso dá-lhe alívio ou deixa-lhe alguma pena?
ACM- Deixa-me alguma pena, especialmente pelo contacto com os alunos. Mas como não é uma quebra total, de certo modo dá-me algum descanso.

Público – Foi um bom professor?
ACM- Não sei, os alunos é que poderão dizer.

Público – De que se orgulha?
ACM- Não sou uma pessoa de sentir um orgulho pessoal…mas gosto de ser professor, gosto de dar aulas, gosto do contacto com as pessoas, gosto de ensinar, de discutir as coisas…O único trabalho de que não gosto é de fazer exames.

Público- Porquê, tem dificuldade em avaliar?
ACM – Tenho sempre algum problema de consciência sobre se sei a nota exata, se me enganei, em comparação aos outros alunos…

Público – O que prefere fazer?
ACM- Investigar, compreender as coisas melhor, de outros ângulos, outras perspetivas. Acho que a vida não tem sentido se a pessoa não investigar, se não estiver descontente com aquilo que sabe, se não quiser ir mais longe, para fazer melhor. Manter esta curiosidade pelo novo acho que é essencial. O homem cria uma civilização por isso mesmo. Porque não está totalmente satisfeito com aquilo que sabe e com o que faz.

Publico – De que tem pena?
ACM – De não ter tempo suficiente para me dedicar mais, ter mais tempo livre para pensar.

Público – Será o povo português muito psicanalisado? Há muitas pessoas a procurar a psicanálise?
ACM – De um lado a psicanálise na sua forma mais clássica (no divã, três, quatro vezes por semana) não está indicada para todas as pessoas. Mas os psicanalistas têm utilizado outras técnicas, o psicodrama analítico, a terapia familiar psicanalítica, a psicanálise de grupo, as psicoterapias dinâmicas de orientação psicanalítica, breves e de longo curso; e essas hoje, fazem-se muito mais. Não há mais psicanalistas, mais clientes…

Publico – Quantos psicanalistas há hoje em Portugal?
ACM – Há 16 titulares que é o grau máximo, 24 membros aderentes e 98 candidatos. Estes já fazem análise sob supervisão, ainda não são totalmente autónomos.

Publico – É muito pouco?
ACM- Está mais ou menos ao nível das sociedades europeias e americanas; em relação à nossa população estamos bem. Há países que têm uma proporção maior, por exemplo, a Holanda, que tem muitos psicanalistas, ou a Argentina, onde há uma certa inflação.

Público – Quais são os principais clientes dos psicanalistas, homens ou mulheres?
ACM- Há talvez, maior quantidade de mulheres, fundamentalmente da classe média, mais entre intelectuais, mais de pessoas com profissões ligadas ao contacto humano.

Publico – De que idade?
ACM- Normalmente da terceira, quarta década.

Publico – Porque será?
ACM – É nesta ultima altura que as pessoas já têm experiência de vida suficiente.

Publico – É a altura que as pessoas mais querem mudar?
ACM – Penso que não é bem isso, mas é a altura em que muitas das pessoas perderam o emprego, descasaram, as relações não correm bem com os amigos e começam a refletir nestes insucessos. Procuram compreender melhor porque isso acontece, como poderão viver de uma forma mais eficiente, mais agradável, mais feliz. A partir dos 50, as pessoas já desistem um bocado de se transformar. Sentem que não têm tempo, que já não lhes apetece mudar…

Publico – Por que há mais mulheres a procurar a psicanálise? São mais frágeis?
ACM – Por várias razões, uma delas é porque há mais mulheres nas faculdades. É um fenómeno sociocultural. As mulheres despertaram, têm um largo interesse pela cultura.

Publico – Não percebo que relação pode ter isso com a procura da psicanálise
ACM – É a procura da cultura…

(CONTINUA)











quarta-feira, 22 de agosto de 2012

Interioridade

Josef Fischnaller

“Confundimos demasiadas vezes narcisismo com solidão, mas o processo é na realidade inverso: Narciso está só porque está rodeado por espelhos que o impedem de ver aqueles que estão à sua volta; pelo contrário, o solitário apoia-se em si próprio. Aliás, Pascal dizia: O homem que gosta apenas de si mesmo odeia acima de tudo ficar sozinho consigo próprio.
Erroneamente, associamos a solidão ao egoísmo e ao egocentrismo, enquanto a vida sozinho e, em particular, o celibato, pode permitir uma abertura ao mundo que a vida em casal não permite, e a solidão desempenha muitas vezes um papel de propulsor para ir para outra coisa. A dificuldade em estabelecer relações sólidas num mundo incerto leva as pessoas a virar-se para outras aspirações. A carência, o fracasso, o sofrimento servem por vezes de impulso para progredir. Podemos encontrar aí a força para inventar outros laços.”
Marie- France Hirigoyen As Novas Solidões Na era da comunicação estamos mais sós Caleidoscópio

Narciso representado na imagem por uma personagem feminina exibe prazer em ser admirado à distância (não é por acaso que tem um revolver na mão), e não está disponível para relações de reciprocidade. Muito dependente do olhar do outro, tem também o desejo de tudo agarrar.
Outra coisa é estar atento a si próprio e ao que na verdade nos convém, de acordo com as nossas necessidades. Por vezes, esta (boa) solidão é escolhida. Começa por pequenas alterações nos hábitos quotidianos. Já não nos apetece ir ao encontro de…,fazer isto ou aquilo. Questionamo-nos repetidamente “Para quê?”. Dá medo. Não sabemos até onde nos levará. As pessoas avisam-nos que este aparente desligamento pode não ser saudável e que é preciso convivermos. Se não nos enchermos de amargura ou desprezo pelo mundo, um sadio silêncio cobre-nos, como se todas as coisas fossem depuradas, e só restasse o lugar que tem a ver com a nossa história pessoal e com todo o de melhor soubemos reconstruir de nós mesmos e do nosso passado. Não consideramos que nos perdemos na vida. Entendemo-la como um caminho que foi necessário. Os pequenos prazeres, mesmo solitários, são surpreendentes e servem para reafirmar o íntimo sentido de liberdade. Por nos amarmos, já não nos importarmos com o julgamento de quem não interessa. Tornamo-nos mais seletivos em relação aos outros.
Há quem diga que se pode pagar um preço, mas quem passa para a outra margem do sentido de viver, quem fez este crescimento espiritual, sabe que está mais rico por este trabalho ter sido feito dentro de si.

domingo, 19 de agosto de 2012

Paradoxo da arrogância

 
Paper Sculpture Sir Antony Caro 1981

Quanto mais vazio é o homem, mais se encontra cheio de si mesmo” Puchkine
Ou o paradoxo do narcisismo - a inflação máxima do eu, que ao acumular títulos, diplomas, fortuna ou poder, a fim de encher o vazio, se valoriza a si mesmo não deixando espaço para um outro, ou para o pacifico convívio consigo próprio.

quarta-feira, 15 de agosto de 2012

Paradoxo da pérola


Paradoxo da pérola - o que não nos mata torna-nos mais fortes.
Ou a metáfora da pérola - para que possamos dar valor às nossas atitudes combativas perante as adversidades, mas também à suficiente resignação por aquilo que não é possível mudar:


“Cyrulnik (1999) propõe a metáfora da pérola para ilustrar o oxímoro (paradoxo) deste maravilhoso infortúnio do funcionamento da resiliência. Quer dizer, como a partir de uma ferida e de um sofrimento o sujeito pode construir uma experiencia potencialmente proveitosa para si. O resiliente elaboraria um oxímoro  cujo modelo seria o da pérola fabricada pela ostra como resposta a uma agressão. Assim o processo psíquico e comportamental do individuo resiliente perante uma situação traumatogénica seria comparável ao trabalho da ostra que, para se proteger do grão de areia que a fere, segregando nácar à volta do intruso, vai arredondar as asperezas do grão de areia e dar origem a uma joia preciosa. A resiliência seria forjada pelo individuo perante as agressões da vida e o sujeito resiliente conservaria assim este potencial que o iria ajudar a enfrentar a sua trajetória de vida em boas condições.
A metáfora da ostra perlífera ilustra bem como, por vezes, é a partir de uma experiencia de sofrimento que podemos revelar forças até aí mantidas latentes e desconhecidas. A resiliência surge assim como resultado de um processo paradoxal no qual o confronto com o traumatismo e a ferida gera criatividade. Todavia, a beleza da metáfora da ostra perlífera não faz esquecer a ferida original, e não quer dizer, portanto, que o sujeito resiliente evite o sofrimento perante o trauma e o stress.”
Marie Anaut A Resiliência - Ultrapassar os Traumatismos Climepsi

Contudo, refere Cyrulnik, apesar de oximoro descrever “o universo íntimo desses vencedores feridos - o triunfo de um ferido nunca desculpou o agressor”.

Estranha forma de vida


Armando Aguiar Cor, tempo, Humor e Movimento 2002

O homem está confrontado com uma patologia de insuficiência mais do que uma doença do erro.” Alain Ehrenberg, sociólogo
O medo de errar sempre poderia proporcionar uma ansiedade localizada, mas ter medo de não estar à altura das exigências, de não conseguir ser (belos, ricos, produtivos....), poderá acionar uma ansiedade flutuante e por isso mais aniquiladora.
A natureza do trabalho, a incompetência dos gestores, os objetivos não partilhados e a desumanização das relações laborais, são fatores que favorecem esta patologia. Mas nem sempre o tirano vem de fora. Vem muitas vezes do nosso interior, dos altos padrões que colocamos a nós próprios ou da nossa dificuldade em pedir ajuda – a super-mulher, super-mãe….é a caricatura.

sábado, 11 de agosto de 2012


Cena do filme Reflections in a Golden Eye de John Huston com Elizabeth Taylor e Marlon Brando

sexta-feira, 10 de agosto de 2012

O desespero

imagem do filme O Cavaleiro das Trevas Renasce

 “… quando tende a agir, tende a não perceber e quando efetivamente percebe, nada pode fazer de prático com suas perceções. A lucidez dessas perceções, contraposta à atuação compulsiva e quase sempre desastrada, pode gerar um grau insuportável de desespero que o conduza, inclusive, ao suicídio.”
Luís Cláudio Figueiredo O Caso-limite e as Sabotagens do Prazer Revista Latino Americana de Psicopatologia Fundamental, III, 2,61-87 (é sobre a patologia borderline)

Dizendo este texto respeito à dor, por dificuldade em se desembaraçar do conflito após ter agido mal, relembrei-me ontem deste assunto enquanto assistia ao ultimo filme do Batman O Cavaleiro das Trevas Renasce (do qual retirei a imagem do poço que ilustra este post ), que é uma fantástica metáfora à vida.
Batman que embora tenha escolhido a solidão, permitiu-se enfrentar os demónios do passado, explorar sentimentos e daí descobrir forças novas.
Se há uma moral da história, poderá ser:o que importa é, apesar de cair várias vezes ao tentar escapar por aquele poço, tentou reparar as situações e ultrapassou os obstáculos 

Freud sobre os remédios sedativos

Tão atual que nos questionamos sobre se de fato evoluímos. Mas a verdade é que sim, em particular aqueles que conservam a sua sensibilidade e independência:

“A vida tal como ela nos é imposta é demasiado dura para nós; traz-nos demasiados sofrimentos, deceções, tarefas irresolúveis. Para aguentar, não podemos prescindir de remédios sedativos. Existem três destes remédios: potentes diversões que nos permitem não valorizar a nossa miséria, satisfações substitutivas que a diminuem e estupefacientes que nos tornam insensíveis a ela”
Sigmund Freud O Mal-estar na Civilizaçãoaqui )

terça-feira, 7 de agosto de 2012

As novas solidões

Li nas férias As Novas Solidões de Marie- France Hirigoyen, que analisa estados de solidão vividos com energia e inspiração por homens e mulheres na nossa sociedade, mas também o isolamento sofrido de muitos de nós. Voltarei a vos falar deste livro. Por agora, uma breve passagem:

"Depois da separação, é raro as mulheres procurarem de imediato voltar a viver a dois no sentido tradicional. Elas consideram que precisam de um certo período de recuperação, sozinhas, para se recompor, reconstruir. Para uma nova vida a dois, elas impõem condições, como explica Lara , 45 anos:
   Não me importo de voltar a viver com alguém, mas é preciso que valha a pena. O outro tem de me dar algo mais, não apenas a sua presença, mas também segurança material, introdução a um ambiente social mais educado e, sobretudo, um estímulo intelectual, cultural ou uma abertura para um mundo desconhecido.
A maioria das mulheres já não quer as relações de força que uma relação amorosa implica muitas vezes; estão cansadas dos jogos de sedução, das tomadas de poder de um e de outro, do receio permanente de serem deixadas. Algumas mulheres tentam encontrar um novo companheiro, mas têm consciência de que, para isso é preciso preparar-se. Em primeiro lugar, têm de virar a página da vida passada; depois, organizar-se, mostrar-se feminina – pois os homens procuram mulheres sexy que estimularão a sua libido -, dar a ilusão de ligeireza – pois uma mulher atormentada não é atraente - , saber todavia gerir problemas  de intendência – pois um homem não gosta de olhar para um futuro com problemas – e fingir felicidade – pois como seduzir quando se toma antidepressivos com o aperitivo?
Perante tantos esforços, algumas mulheres desistem. Para cada vez mais mulheres, independente do que digam e, sobretudo, do que dizem as revistas femininas, o amor não é prioridade. Primeiro, elas procuram realizar-se profissionalmente e obter uma certa segurança material para, de seguida, tratar da estabilidade amorosa. É o caso da Béatrice, 57 anos, enfermeira:
   Não ponho em causa o amor dos homens, mas é um amor que implica que eu trate deles e estou farta disso. Criei meus filhos, tratei dos meus pais doentes enquanto trabalhava, agora gostava de encontrar alguém que tratasse de mim e, como sei que não vou conseguir, prefiro estar sozinha.

Atualmente, quanto mais uma mulher adquire autonomia, mais difícil será voltar a viver a dois depois de um divórcio. Ela já sabe gerir o tempo, o dinheiro, os passatempos, as amizades e não está disposta a aceitar qualquer tipo de controlo. Sente um verdadeiro prazer em dominar a situação. As mulheres que vivem bem nesta solidão são frequentemente perfeccionistas, irrepreensíveis; têm por vezes um ego supercontrolado, que procura atingir a perfeição."
Marie- France Hirigoyen As Novas Solidões - Na Era da Comunicação Estamos Todos Mais Sós Caledoscópio