Caravaggio, Narciso
"Descontraído e ledo, Narciso – um esbelto jovem – passeava na floresta. Eis senão quando, de entre os ramos, surge Eco, a formosa dama de honra da corte de Juno castigada por Zeus, em razão das suas inconfidências, com perda da fala espontânea; só podia reproduzir em eco o que lhe fosse dado ouvir.
Narciso, fascinado pelos encantos de Eco, exclama:
- Amo-te! Como és bela!...
E Eco limita-se a repetir as mesmas palavras em distorção ecóica da voz de Narciso.
Decepcionado com o que interpreta como indiferença e rejeição, Narciso retira-se, magoado e deprimido.
Recolhe-se à beira de um lago, carpindo a sua miséria – de amor não correspondido, de ser desdenhado.
E assim se queda, horas a fio…dias sem conta. Foi-se a paixão da sua vida, a mulher dos seus sonhos. Fica-lhe a tristeza infinda, o desânimo total. Só lhe resta aguardar a morte, olhos pousados na superfície das águas – que espelha a sua imagem de desalento. Mas da qual entretanto se enamora, reza a lenda; perdido no desencanto da relação desejada mas não vivida – a relação depressígena, que ficou aquém do desejo e do fantasma; e o sequente refúgio narcíseo."
Coimbra de Matos no Prefácio de Teresa Flores, Narcisismo e Feminilidade, Climpsi Editores
O encontro é desejado mas não vivido, pela dificuldade em criar relações de intimidade, porque estas pressupõem igualdade, dependência e necessidade de ajuda.
É a desistência de relações de reciprocidade, resultante da decepção de não se ter sido amado, quando, na infância, se era absolutamente dependente e a necessitar de ajuda.
Coimbra de Matos é psiquiatra e psicanalista
Coimbra de Matos é psiquiatra e psicanalista
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