segunda-feira, 13 de junho de 2011

Steven Sherman

Steven Sherman, psicólogo social da Universidade do Indiana, EUA, interessa-se pela maneira como os seres humanos constroem estereótipos. Sherman diz que isso acontece porque temos uma irresistível tendência para organizar o mundo em categorias. Numa conferência no Instituto Superior de Psicologia Aplicada, em Lisboa, há algumas semanas, Sherman expôs os resultados das suas pesquisas. É entrevistado por Ana Gerschenfeld do Jornal Publico. Dessa entrevista, apresentada na edição de hoje, aqui fica uma parte:

Por que consideramos que Barack Obama é negro?
Steven Sherman: Com base nas nossas pesquisas, qualquer rosto que possui uma mistura de traços maioritários e minoritários tenderá a ser categorizado como pertencendo à minoria. Claro que as razões são também em parte sociopolíticas, sociológicas, mas acho que o fenómeno faz mesmo parte das nossas percepções. Barack Obama possui as características faciais negras mais salientes. Também tem características brancas, mas nós não reparamos nelas, fazem parte do cenário, estão lá e pronto.

Estamos "programados" para construir estereótipos?
Steven Sherman: É uma maneira bastante justa de enunciar as coisas.

O racismo não surge apenas de preconceitos sociais ou culturais?
Steven Sherman: Não. Existe também uma razão de ordem cognitiva e não se trata apenas de animosidade, discriminação ou do facto de não gostarmos das pessoas negras. Por vezes, efeitos puramente cognitivos podem conduzir ao mesmo tipo de resultados que efeitos motivacionais.
Acontece que qualquer atributo comum a todas as categorias será associado à primeira categoria que aprendemos, ou seja, à categoria maioritária. É por isso que as características relativas à natureza humana, que todos partilhamos, tendem a ser atribuídas à categoria maioritária - e que temos tendência a "desumanizar" os grupos minoritários: porque os atributos que são em geral associados com o grupo minoritário "costumam" ser mais negativos e pouco humanos. Não é uma maneira muito feliz de ver o mundo, mas é provável que a realidade seja essa. Nem todas as teorias psicológicas e biológicas são positivas no que respeita à condição humana.

Ao mesmo tempo, o facto de saber que somos assim pode ajudar-nos a contrariar essa tendência natural?
Steven Sherman: Sim, mas é uma luta. Seria muito mais agradável se não tivéssemos de combater esses instintos. Eu não estou de maneira nenhuma a defender a existência de estereótipos, sobretudo quando são negativos e destruidores, mas também nem sempre é verdade que possamos culpar as pessoas e acusá-las de odiar outrem. Algumas dessas percepções ocorrem de uma forma muito natural - e é preciso educação e esforço para lutar contra elas. Se pedirmos a alguém para escrever o que pensa dos idosos, dos judeus, dos negros, dos muçulmanos, vai dizer que gosta de todos eles. Mas a medição de certas atitudes não-conscientes em relação aos grupos minoritários revela que são muito negativas - em especial perante rostos negros, que são mais fáceis de associar a atributos maus do que a atributos bons. Isso acontece em todo o lado [onde os brancos sejam maioritários] - e acontece sem dúvida nos EUA e na Europa.
Ninguém gosta de ouvir dizer que talvez tenhamos conseguido livrar-nos dos nossos preconceitos explícitos - das nossas leis de segregação, de escravatura - mas que esses sentimentos implícitos que temos e que nem sequer controlamos são muito mais subtis e até mais destruidores.
Por exemplo, face a dois candidatos, um branco e um negro, a um emprego que exija experiência e formação ao mesmo tempo, as pessoas vão ter tendência a optar pelo candidato branco, argumentando que a formação é mais importante que a experiência - se for o caso da pessoa branca. Mas se o candidato branco tiver mais experiência e menos formação, então o argumento será que a experiência conta mais para o emprego. Ora, essas pessoas não fingem, não mentem, acreditam firmemente no que estão a dizer. Construímos um mundo em coerência com os nossos sentimentos e é difícil fugir a isso. Estes tipos subtis de estereótipos e preconceitos podem desenvolver-se a partir de mecanismos cognitivos muito gerais.
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Nestas experiências, as pessoas não se davam conta de que existia uma diferença na frequência com que apareciam determinadas fotografias?
Steven Sherman: Não. Muita dessa aprendizagem de categorias passa-se a um nível não-consciente. Aliás, isso representa uma mudança radical na Psicologia nos últimos 20 a 25 anos. Não há assim tanto tempo, todos se riam de Freud porque falava do inconsciente. Parecia mesmo estúpido pensar que as coisas podem acontecer sem darmos por elas! Hoje, quem não fala no inconsciente é que é considerado muito estúpido, porque quase tudo o que fazemos é não-consciente. Não estamos cientes de processos automáticos, podem ser-nos mostradas coisas a um nível subliminar. Ainda há quem se ria de Freud, mas é um facto que muitas das coisas que ele disse sobre o inconsciente estão perto do que nós cientistas dizemos hoje.

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