sábado, 5 de fevereiro de 2011

Incapacidade de amar em Pessoa


Celeste Malpique psiquiatra e psicanalista no seu livro “Fernando em Pessoa”, Editora Fenda, apresenta uma reflexão psicanalítica deste autor da Língua Portuguesa.
A obra contém no capítulo Leituras Prévias, três textos de psicanalistas. Um texto de António Coimbra de Matos, outro de Carlos Amaral Dias e outro de Emílio - Eduardo Guerra Salgueiro.

Acerca da personalidade de Fernando Pessoa, Celeste Malpique encontra, com base em W. Bion, um núcleo esquizóide e frágil, sendo o narcisismo um tema central.
Para os menos habituados às características clínicas dos psicóticos, Bion identifica “o ataque à realidade, a recusa da verdade e a enorme resistência à transformação, isto é ao crescimento mental.”

Deixo-vos um pequeno fragmento desta obra, para ilustrar esta análise:

Incapacidade de amar
   A timidez, isto é, o evitamento fóbico da intimidade tornou pobre a sua vida relacional pois, desde muito cedo se refugiou na solidão. No retraimento narcísico procurou um escudo protector atrás do qual se permitia ser crítico e cínico observador ou atrás de uma máscara dar forma a impulsos eróticos.
   Não podemos falar de uma cápsula autística mas de um espelho reflector onde via o reconhecimento dos outros – ser admirado, ser amado - , mas de cujos limites não arriscava sair, sob pena de se sentir ameaçado pela intrusão ou até envolvimento fusional.
   Na organização esquisoide que constitui o cerne da sua personalidade, amar o objecto, isto é tomar posse do objecto significa destruí-lo e, para evitar esse conflito primário, pré- ambivalente, surgem as clivagens. Para manter o amor do objecto (idealizado) toma para si a culpa de não ser amado (defesa moral de Fairbairn). E recordemos que Fernando sempre se considerou feio, pouco atractivo, desprezível na sua imagem corporal, e se queixava de ser tímido, passivo, desajeitado, falho de vontade. Não estava ausente da sua lúcida consciência a sua real incapacidade de amar.
   Esta organização esquisoide da personalidade foi tão precoce que podemos mesmo admitir que a orientação sexual nunca ficasse bem definida.
   Ele próprio reconhece em si essa dualidade, sinal de uma bissexualidade psíquica não ultrapassada: “ …um temperamento feminino com uma inteligência masculina….”pag 127









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