sábado, 26 de março de 2011

Lobo com pele de cordeiro # 1

de David Parkins

Poderia recorrer à fábula “O lobo com pele de cordeiro” para ilustrar o comportamento das pessoas que usam um modo camuflado de violência. Mas no livro de fábulas de Fredo “A irmã e o irmão” parece-me mais próxima da nossa realidade:
“Um certo homem tinha uma filha muito feia e um filho admirável pelo belo rosto. Estes, brincando puerilmente viram por acaso um espelho. O rapaz gaba-se por ser formoso, a rapariga que não suporta os gracejos do irmão, corre para o pai, a se queixar do comportamento daquele. O pai, abraçando um e outro, e repartindo beijos por ambos com doce amor, disse: “Quero que vós useis do espelho todos os dias. Tu filho, para que não corrompas a beleza com vícios de maldade. Tu, filha, para que venças esta face feia com bons costumes.”

Como nos parece bem-intencionado este pai! Mas sobre esta capa, não deixa de humilhar os seus filhos, só que o faz com “uma forma erótica da hostilidade”(Robert Stoller). Fá-lo indirectamente – coloca entre a sua intenção de humilhar, os valores de humildade e correcção que qualquer pessoa aprovaria. É um perverso narcísico que utiliza a violência oculta, que não se vê à primeira vista, mas que lhe dá, aos seus olhos, a valorização de ser um bom educador que ama os seus filhos. Faz o mal fingindo fazer o bem.
A vítima só muito mais tarde se dá conta de um desassossego. De um estado de angústia inominável que aos poucos pode ser de tal modo lesiva que toma conta do pensamento, deixando-a invadida por emoções negativas. 
Nem sempre a violência é oculta, mas o propósito será sempre fazer valer as  necessidades pessoais de quem a pratica.
No ambiente familiar ou em outros contextos, aqui vos deixo os perfis destas personagens, por muitos considerados psicopatas passivos, gente mal-amada, que utiliza a sua agressividade de um modo parasita, ou pela sedução, ou pelo ataque directo ao amor-próprio do outro:

“Certas personalidades psicopáticas, de malignidade encoberta mas altamente patogénicas, procedem de modo atrás referido – mantêm em segredo a sua violência e deslealdade: vestem pele de cordeiro mas devoram como lobos. Entram neste grupo as personalidades passivo-agressivas, certos paranóicos com necessidade de controlo omnipotente do desejo e vontade do outro, uns tantos sádicos e exploradores, alguns perversos, as personalidades obsessivo-compulsivas (que controlam pela força) ou histéricas (que controlam pela sedução) regularmente compensadas, muitos doentes com perturbação narcísica que usam e abusam do ataque camuflado mas persistente ao narcisismo do outro e, por último, outras tantas pessoas repletas de inveja”.
António Coimbra de Matos, Violência inconsciente, Revista Portuguesa de Pedopsiquiatria, 1991, nº 2

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